25 julho 2006

Trupes - Parte 1

Uma coisa que o pessoal da Irmandade gostava muito de fazer (uns mais do que outros) eram trupes. E fazíamos, sobretudo nos nossos primeiros anos. A partir de certa altura eu comecei a ficar velho para isso e já só fazia trupes “pela certa”, ou seja, fazia muito poucas trupes, quando me pediam muito e eu achava que determinados indivíduos mereciam participar numa trupe chefiada pelo BATINAS, e se aparecessem, pelo menos, 40 ou 50 pessoas. Fartei-me de ter problemas em trupes por causa dos ignorantes e de passar tempos infinitos em discussões com gajos “calhaus” que não percebiam nada de Praxe e queriam-me dar lições acerca do que não sabiam, por isso, nos meus últimos anos de estudante, só fazia trupes onde não desse para haver discussões com burros: éramos muitos, o caloiro estava debaixo de trupe e era rapado e ponto final na conversa.
Mas ao longo de muitos anos de trupes, algumas histórias engraçadas aconteceram e são algumas delas que aqui vou contar agora.
Uma coisa que era muito costume acontecer era os ignorantes passarem por nós – geralmente em grupos grandes, claro!, ou muito ao longe (cobardes) – e chamarem-nos “morcegos”; certo dia fizeram isso e eu dirigi-me a eles para perguntar o que queriam de mim; surpreendidos, perguntaram-me se eu me assumia como morcego, ao que eu respondi: “Claro! Eu sou o Batman...”.
Em certa trupe apanhamos um caloiro de medicina que disse ser de Fafe. Como eu tenho uma prima de Fafe que também era caloira nesse ano e que também tentara entrar para medicina, perguntei-lhe se ele a conhecia, ao que ele disse que sim e, vendo aí que teria alguma hipótese de se safar, disse “por acaso até sou muito amigo dela”; resposta minha: “ pois eu também vou ser muito seu amigo e vou dar-lhe um rapanço bem fundo!”; e assim o fiz, para desespero do desgraçado; mais tarde contou-me a minha prima que ele se tinha ido queixar de mim, que pensara que eu o ia safar por ser amigo dela e ainda foi pior!
Outra vez apanhei um caloiro de sociologia, numa altura em que as eleições estavam próximas na minha faculdade e eu não queria rapar pessoal da FEUC, pois andava sempre metido em listas e não queria perder votos. Por causa disso, disse que lhe dava apenas uma simbólica, pois assim até era capaz de lhe sacar o voto por ter sido porreiro. Só que ele tinha muita estima na sua crina de ouriço-cacheiro, toda espetada para cima e cheia de gel, e não queria. Claro que se aquilo fosse noutra ocasião era rapado e mais nada, mas as eleições... então eu dizia-lhe que só lhe dava a simbólica e que não lhe ia deixar marca, mas ele não queria... Surge então uma proposta do Poupas: ou a simbólica, ou ir nu para casa (isto foi numa fria noite de Janeiro, perto do D. Dinis e o caloiro morava nos Olivais). E não é que o caloiro quis ir nu para casa? Despiu-se todo, deu-nos a roupa e ainda nos deu a chave do jipe, onde nós pusemos a roupa dele. Combinou-se então que ele passaria no dia seguinte em minha casa para ir buscar as chaves do jipe e assim aconteceu.
Com a experiência de muitas trupes, fomos aperfeiçoando a nossa técnica, quer para deitar a mão aos sabujos, quer para cortar mais fundo; prova desta segunda foi o facto de, a partir de certa altura, ter acabado quase com “ad libitum” (cada um dar o número de tesouradas que quer na crina do caloiro) e passei a dar, quase sempre, o 3/2 ou o 2/1 (o chefe dava 3 tesouradas e os outros davam 2 cada, ou o chefe dava 2 e os outros davam 1 cada, respectivamente), uma vez que eu, com duas tesouradas, dava cabo do cabelo aos caloiros e ainda tinha lata de lhes dizer que “com um bom barbeiro, isso nem se nota que foi rapado!”; exemplo da segunda, é a história de ter caçado um caloiro à meia noite e trinta segundos, à porta de casa dele. Mas esta história é a seguinte: comecei-me a aperceber que muitos caloiros iam para casa logo à meia noite ou meia noite e pouco, por isso comecei a combinar com o pessoal em repúblicas (pois eram mais perto dos locais frequentados do que a Porta Férrea e não davam tanta barraca como a porta da Associação Académica de Coimbra) um bom bocado antes da meia noite e a fazer trupes à meia noite em ponto. Esse caloiro de que falei acima tinha saído de uma Assembleia Magna antes da meia noite para não ser rapado, mas tramou-se por alguns segundos. Esta situação acabou por dar barraca por causa de ele vir da Magna e a coisa até acabou por dar origem a um debate na Rádio Universidade de Coimbra (RUC), mas eu tenho, a meu ver, a razão do meu lado por vários motivos:1º - Não é - ou, pelo menos, não era – proibido fazer trupes nesses dias (portanto, praxisticamente, não havia nada a apontar, embora moralmente pudesse haver, mas aí também tenho a consciência tranquila, pelas razões que continuarei a enunciar); 2º - Caloiro não disse que vinha da Magna; 3º – Mesmo que tivesse dito, eu não poderia ter a certeza disso e não é por haver Magna que os caloiros podem ir todos para a borga e depois safarem-se por virem dizer que tinham ido à Magna (na Magna é que lhes deviam dar um papel à saída onde constasse a hora a que tinham saído de lá, afim de terem a meia hora seguinte para se dirigirem a casa). Mas pronto, os anti-praxistas agitaram-se muito, mas ficou tudo em águas de bacalhau – os cães (antipraxistas) ladram, mas a caravana (a Irmandade das Sombras) passa.
Lembrei-me agora de outra engraçada que se passou com o Marralheiro e vai ser a última que vou contar neste artigo - outros sobre trupes virão - e que foi uma situação em que o caloiro vinha com um daqueles 99% de “doutores” que não percebem nada de Praxe, mas que dão muitos palpites. Consta então que o gajo não estava em condições de proteger o caloiro (nem me lembro sequer que grau teria ele na Praxe) mas começou a explicar Praxe ao Marralheiro, a dizer que as coisas eram assim, que eram assado, e trinta por uma linha; falou, falou, falou e o Marralheiro ouviu, ouviu e não disse palavra; quando ele se calou, pensando talvez que tinha convencido o Marralheiro, este vira-se para o ignaro e diz-lhe com muita calma, com uma voz muito educada: “olhe lá, você não percebe nada de Praxe, pois não?”, ao que ele respondeu com humildade “Não”; “Pronto, então vamos rapar o caloiro”. E raparam e o ignaro nem abriu a boca para reclamar!

6 comentários:

Anónimo disse...

Muito bem, belo blog!
Espero que contem muito mais histórias dos tempos de estudante, porque adoro lê-las. Fazem parte da memória de todos nós.

Douto amigo B., tu que é um contador de histórias nato, porque não contas um dia a do guisado de gato, como uma vez nos contaste tão bem?

Anónimo disse...

Acho que as trupes são uma asneira. Nenhuma história de substitutos de policias estudantis me convence.. são apenas uma cambada de gajos que não sabem o que fazer da vida, nem engatar gajas provavelmente conseguem, então surge pseudo-hierarquia, que os torna uma especie de pseudo-dominantes. Gosto de ouvir historias de pessoal que se diverte, seja sobre o efeito do alcool, seja com a irmã do meu vizinho, mas chateia-me um pouco que uma cambada de anormais se divirta assim. Gosto de ser praxado, conviver com os doutores e respectivos semelhantes, desde que me respeitem, mas desrespeito qualquer tony que tente invadir o meu espaço.

Batinas disse...

Em relação ao comentário do Guilherme, cumpre-me, em primeiro lugar, saudá-lo por ter acedido ao melhor blog sobre Praxe e vida académica Coimbrã da internet e pelo interesse que demonstrou pelas nossas histórias, a ponto de comentar uma delas. Seja bem-vindo, apareça sempre, e comente sempre que quiser: isto é um espaço aberto a todos.
Em segundo lugar, cumpre-me comentar o seu comentário.
1) Quando diz que acha que as trupes são uma asneira, é uma opinião como outra qualquer. Felizmente, ou infelizmente, as coisas são como são há muitos anos, a Praxe é tradição e não é a sua opinião que deve ser imposta a todos os outros só porque o Sr. pensa dessa maneira, a ponto de se mudar aquilo que é uma tradição; há quem concorde com a Capa e Batina e quem não concorde; há quem concorde com as festas do S. António ou S. João, ou da Senhora da Agonia e quem não concorde; há quem goste de pastéis de Belém, de Tentúgal ou ovos-moles de Aveiro e há quem não goste; enquanto houver quem goste, as tradições são para continuar;
2) Quando diz que quem faz trupes é uma cambada de gajos que não sabem o que fazer na vida, mais uma vez tenho que lhe dizer que essa é a sua opinião e é uma opinião que, por sinal, está errada: o pessoal com quem eu fiz muitas trupes e com quem continuo a manter contacto, acabou todo o curso e está todo bem na vida. Diria que a sua opinião vale tanto como quem perfilhe a opinião de que quem passe a vida em discotecas a ver se “papa” gajas não sabe o que fazer na vida; ou quem perfilhe a opinião de que quem anda por Coimbra a beber copos também não sabe o que fazer na vida. São opiniões, válidas, é certo, mas são opiniões apenas;
3) Concordo consigo quando diz que o chateia um pouco que uma cambada de anormais se divirta assim. Felizmente, sempre fiz trupes com gente normal, ou se de anormal tinham algo, era uma inteligência muito acima daquela dos perfeitos atrasados mentais que passavam as noites em discotecas a ver se conseguiam papar uma gaja, a esmagadora maioria das vezes sem sucesso!;
4) Por último, uma informação, visto que escreve uma coisa, subentendendo-se, pelo que diz, que não tem a certeza do que afirma: "nem engatar gajas provavelmente conseguem". Visto que acha que “provavelmente” nem gajas conseguíamos engatar, devo informá-lo que aquilo que acha provável é improvável: nunca tive dificuldade em ter gaja, bem como a maior parte dos meus amigos; digamos que a média de gajas "papadas" era igual à media de gajas “papadas” pelos frequentadores assíduos de discotecas do meu tempo; com a vantagem de não procurarmos nem metade. Sabe, as gajas sempre gostaram de gajos conhecidos e com "tomates" para fazer trupes e praxar. Achavam-nos mais inacessíveis, pois não estávamos sempre que nem cães atrás de cadelas com cio. Claro que hoje os tempos são outros e à maior parte das gajas tudo lhes serve para lhes sossegar os calores!

Carolus Alvus disse...

Apenas gostaria de deixar algumas considerações acerca do comentário do Sr. Guilherme:
1.º - “Acho que as trupes são uma asneira” – As trupes não são asneira alguma. Asneira, sim é considerar-se praxista só para aquilo que nos dá jeito e até é, vá lá, engraçado;
2.º - “Nenhuma história de substitutos de policias estudantis me convence” – Vamos lá ver, ninguém aqui o quer convencer de coisa alguma. Apenas se tentou com este artigo dar a conhecer algumas das razões histórico-tradicionais para a existência de trupes;
3.º - “São apenas uma cambada de gajos que não sabem o que fazer da vida” – Meu caro amigo, quanta presunção leio nas suas palavras! Será que, por acaso, conhece todos, mas mesmo todos, os estudantes e antigos estudantes de Coimbra que já participaram em trupes? Parece que sim, de outra forma não se compreende a generalização;
4.º - “nem engatar gajas provavelmente conseguem” – Mais uma afirmação perigosa. Proponho-me desde já a um curso intensivo de engate de gajas no qual o Sr. Guilherme, esse “supra-sumo” do “engatanço nacional” seja o formador. Se calhar, andei enganado este tempo todo;
5.º - “então surge pseudo-hierarquia, que os torna uma especie de pseudo-dominantes” – “Pseudo-hierarquia”? O Sr. Guilherme diz que até gosta de ser praxado mas não concorda com hierarquias. É uma maneira de ver as coisas. De facto, até deveria ter a sua piada ver um caloiro a mobilizar outro caloiro;
6.º - “Gosto de ouvir histórias de pessoal que se diverte, seja sobre o efeito do álcool” – Nisto estamos de acordo;
7.º - “Gosto de ouvir histórias de pessoal que se diverte (…) com a irmã do meu vizinho” – Só por curiosidade (sim, que eu como praxista que sou e trupista que fui tenho grandes dificuldades em engatar gajas), a irmã do seu vizinho é mesmo boa? É fácil de engatar? Ou será que ela é apenas “divertida”?
8.º - “mas chateia-me um pouco que uma cambada de anormais se divirta assim” – Assim como? A beber?, com a irmã do seu vizinho?, a fazer trupes? Bem, cada um é como cada qual, mas nunca entendi as trupes como forma de diversão;
9.º - “Gosto de ser praxado, conviver com os doutores e respectivos semelhantes, desde que me respeitem” – Pois claro, para uma mobilizaçãozita ou para uma caçoada o Sr. Guilherme até está disposto a alinhar na brincadeira. Agora, se for apanhado por uma trupe por estar na rua após a meia-noite, sem ter qualquer protecção (e olhe que até são muitas…), em vez de estar em casa a estudar como compete a um caloiro, isso já ultrapassa os limites do respeito que é devido ao Sr. Guilherme!
10.º - “desrespeito qualquer tony que tente invadir o meu espaço” – Pelos vistos, o “espaço do caloiro”, na opinião do Sr. Guilherme, começa onde lhe acaba a crina.

Anónimo disse...

Ola Doutor Quim Batinas, é com grande nostalgia que leio as suas historias, algumas delas são-me familiares, tais como a do caloiro que foi nú para casa, eu estava lá, felizmente fui um dos caloiros que consegui fugir.Lembro-me de ter participado consigo num rali tascas, não sei se recorda ?? caloiro de Paços de Ferreira
Um abraço...

Batinas disse...

Claro que me lembro de ti! Foste comigo no primeiro peddy tascas em que participei e, na boa (e sem denunciar os outros com quem tinhamos combinado e repartição do prémio, caso alguém conseguisse ficar nos 3 primeiros) acabámos por ficar em 3º. Os outros, ficaram em 1º e 2º e dividiram-se os 3 prémios pelas 3 equipas. Se não se tem feito essa combinação prévia e tivessemos denunciado os tempos dos outros na primeira parte do peddy tascas, tinhamos ganho! Mas foi fixe, para uma primeira vez. Depois acabei por ganhar 5, um segundo lugar, 3 terceiros e um quinto (o último, onde eu já não era para participar).